MUTILADOS CIDADÃOS MODERNOS
Jogaram pedaços pelas janelas
Muitos e muitos pedaços
Ainda pulsantes e ensanguentados
Mãos, pés, pernas, orelhas, narizes,
Olhos, cabeças, ventres, genitálias...
Lançados dos altíssimos prédios
Na avenida, nos transeuntes, que apressadamente atravessavam a avenida
Jogavam pedaços pelas janelas
De mulheres e homens, andróginos pedaços
Continuando a cair sobre os passantes
Sempre seguindo a sinfonia de ruídos
Buzinas, rangidos, teclados, gritos, suspiros ofegantes...
Hipnotizados robóticos caminhantes
Sem cessar jogavam pedaços pelas janelas
Na multidão, na avenida, atingidos por seus próprios pedaços
Um braço caiu num carro, um pescoço numa vitrine
Um fígado descamba no semáforo, um rim num outdoor
Um siliconado seio espatifa-se ao bater no meio-fio
Sobre apressados, na avenida, inúmeros pedaços
Mas eles nada disso percebem
Prosseguindo em seus caminhos
Despedaçamente indiferentes
Apedaçados, mutilados, mulheres e homens
Parece que ja se acostumaram com o sangue, seu sangue
Parece que ninguém vê isso
Que somente eu, bestificado, parei
Só eu me assusto e olho pro alto
Só eu continuo limpo...
Até que um pedaço me atingi
Um coração, meu arrancando coração de homem
Foi quando no mesmo instante
Subitamente surgiu uma criança cega
Que mantinha-se limpa, apesar de tanto sangue Me sorriu, catou meu coração e foi-se embora
Nao sei quem, mas do alto jogavam pedaços
De mulheres e homens, atravessando a avenida
Apressados, seus muitos e muitos pedaços
Nossos arrancados pedaços pelas janelas...
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