domingo, 28 de junho de 2020

NO BALÉ DA REALIDADE CISNES NEGROS SÃO BALEADOS

Foram mais de oitenta tiros
Contra uma família inocente
Negra, num carro branco

Mataram o pai músico
E um rapaz que tentou ajudar
“Foi engano”, disseram os militares
Assassinaram uma menina
Ela tinha oito anos
"Fazia balé", disse o avô
“Houve confronto”, falaram os PMs
Morreu com tiro de fuzil
Era negra também

Um músico, uma bailarina
Que não mais farão arte
Igual há tantas e tantos
Mortos por causa da pele
Que talvez seriam cisnes negros
Um Cruz e Sousa, uma Clementina
Elza Soares, Mano Brown, Elisa Lucinda
Junto com outros e outras artistas
Dando um baile nas estatísticas
Mas que ainda são exceções
Porque no Brasil, balas perdidas
Tem na cor preta alvo tradicional

Num certo dia, eu, ser crítico
Consciente das minhas raízes
Estava num ônibus quando
Entraram dois jovens negros
Cuja simples presença deixou
Todos os passageiros tensos
Inclusive a mim, sim, a mim
Foi quando as Carolinas de Jesus
Dos meus quartos de despejo
Protestaram: “moço, você foi racista!”
E desde então admito que ainda
Tenho senzalas para libertar


Geraldo Ramiere


















IMAGEM: pintura de Wilson Tiberio.

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